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sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Aula de Biologia: Pescoço


Aula de Biologia: "Corpo Humano, Anatomia, ossos, coluna vertebral, pescoço: Composto das primeiras vértebras da coluna, a começar pela Atlas. Pelo pescoço também passam ar, comida, água, sangue, terminações nervosas, nossa voz. O pescoço é a ligação entre a cabeça e o resto do corpo, sendo ao mesmo tempo muito resistente em sua conposição óssea e frágil pela sua importancia vital no organismo..."

O professor segue explicando o funcionamento do pescoço, mas o aluno não quer saber de nada disto...A essa hora da manhã, o aluno não se interessa por pescoço, anatomia, nada de nada...

Subitamente, o pescoço desperta nele interesse. Não o pescoço da aula de biologia, da explicação do professor... O pescoço de uma colega sua passa a ser o tema de sua aula, objeto de estudo sentado logo à sua frente.

Eis o momento em que surgiu o interesse pelo estudo: A mesma colega, sentada ereta, o cabelo solto, era uma visão diária para ele. O cabelo dela, longo e liso, sempre cobria o pescoço... até que, naquela aula, ela resolve relaxar, inclinando o corpo para o lado, recostando-o na carteira e lançando seu cabelo todo para um dos lados. Parte do pescoço se revelara para o até então sonolento aluno. Um pescoço real, quente, de verdade...longe de comparação com o pescoço exposto pelo professor.

Só o movimento da colega o atraíra, a princípio... Mas uma corrente elétrica de repente se espalhou pelo seu corpo. Seu interesse em estudar aquele pescoço cruzava agora o campo da razão e passava também para o da emoção...

Ele estudava então com interesse o pescoço da colega. O objeto de seu estudo se revelava apenas em uma parte, o resto dele escondido atrás de uma cortina de um longo cabelo liso. Mas aquela parte já lhe era suficiente por enquanto, e ele aproveitava cada pedacinho, registrando e avaliando, analisando em sua mente cada milimetro de pele, de particularidade nele: sinais, a marca que o cordão deixava na pele, o modo como aquela pele reagia enquanto sua colega passava os dedos levemente sobre o pescoço...tudo era observado e estudado por ele.

Subitamente, o objeto se revelou por inteiro: a colega o assustou, se ajeitando na carteira num instante e, num passe de mágica que só as mulheres sabem dar a esse movimento, lançando o cabelo para um lado, para o outro, para o alto, enrolando-o e prendendo-o num rabo de cavalo, liberando para a vista e estudo de seu colega de trás todo o seu pescoço, além do cheiro perfumado que seus cabelos deixaram no ar.

O estudo desandou para aquele aluno. Ver objeto que o fascinava agora por inteiro, corrompeu todo seu interesse anterior... Pior, aguçou-o mais ainda: para ele agora não bastava só estuda-lo com os olhos apenas, mas com todos os seus outros sentidos: ele queria respirar o cheiro daquele pescoço, queria sentir o calor que por ele passava, queria tocar a textura daquela pele, sentir seu sabor... chegou mesmo a querer segurar sua colega pelo pescoço, como se prestes a esganá-la, apenas para ter em suas mãos todo aquele objeto que tanto o fascinara.

Perdido em seus delírios, o aluno perdeu a noção de suas ações: lentamente esticou um dos braços e levemente roçou a ponta de um de seus dedos no lado do pescoço de sua colega. Por breves milisegundos ele sentiu como se estivesse tocando a grade dos portões de um paraíso proibido...

A reação de sua colega foi quase instantânea: ela se assustou ao sentir a invasão de uma área privada e intima: seu corpo. Virou-se, com uma cara de quem tentava descobrir o que poderia estar acontecendo. Deu de cara com um colega de classe que ela mal falava, mas que via todos os dias de manhã.

Ele a olhava perplexo, com um olhar de quem descobria alguma coisa tão grande e absurda que sequer parecia entender o que estava fazendo...

Ela o olhou a principio com a cara de alguém que vai ter a pior das reações, que foi surpreendido por um inimigo emboscado mas está de prontidão para responder...

A sala nem reparou a situação: naquela hora da manhã, alguns alunos até dormiam. O professor continuava a explicar a anatomia do corpo humano, sem prestar atenção nas mínimas reações de seus alunos, ainda sonolentos demais para se rebelarem face a uma aula tão chata e parada. Nenhum deles percebia que em duas daquelas carteiras uma crise se iniciara... uma guerra de proporções arrasadoras poderia estar prestes a estourar e afetar o equilibrio apatico daquela sala... e o maximo que se ouvia ali era um bocejo.

Os dois olhares se encontraram por um segundo: nesse segundo, sabe-se lá quais conversações, quais propostas, quais acordos foram feitos. O resultado da discussão dos olhares foi a volta do status quo anterior à invasão do aluno. Paz.

A aluna, ainda mostrando a face intimidante, se virou para a frente novamente, cobrindo o pescoço com a cortina do seu cabelo longo e liso novamente. Seu ultimo movimento foi voltar os olhos para si mesma e dar um breve e pequeno sorriso, antes de voltar a fingir atenção no professor.

O aluno buscou se recuperar do susto. Olhou para os lados: ninguém reparou no que aconteceu ali. Olhou para a frente: o pescoço ficara encoberto; o estudo terminou para ele. Mas aí o cabelo, a cabeça, os ombros, os braços esticados, as mãos na carteira, toda a colega, passaram a ser um novo e fascinante objeto de estudo para ele...


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